Artigo. Não tenho lágrimas para chorar
(*) Humberto Gouvêa Figueiredo
Ao longo dos meus 33 anos de serviços prestados à sociedade, na Polícia Militar do Estado de São Paulo, vi muita gente morrer em serviço.
Policiais dando a vida na defesa de pessoas que não conheciam…tentando recuperar o patrimônio que não era o seu…agindo para garantir direitos que sequer possuíam…
Sempre sofri muito em cada velório e sepultamento que ia.
Sempre me doía fortemente dar o abraço enlutado em quem esperava a volta do filho, do marido, da esposa, do irmão, e que não ocorria.
Sempre me foi tocante dividir o sofrimento de quem entregou para a PM um homem ou uma mulher e recebeu de volta um corpo e uma bandeira do Brasil.
Como era triste conduzir a urna fúnebre ao lado de outros policiais militares nos sepultamentos.
Quando fui para a reserva imaginei que está dor diminuísse, pois estaria mais distante de eventos desta natureza.
Mas, infelizmente, não é assim que ocorre.
Hoje tive notícia de uma ocorrência na cidade de Mauá, em que criminosos roubaram um veículo e atropelaram a jovem Sargento PM Tais Valéria Fanasca Melloni, pertencente ao 38° Batalhão de Polícia Militar Metropolitano.
Ela não resistiu aos ferimentos e faleceu.
Tinha só 42 anos, 22 dos quais dedicados à PM e hoje se despediu da vida deixando duas filhas órfãs.
Deveria estar de folga, talvez até ao lado das filhas ou quem sabe no lazer ou descansando, mas em função do vergonhoso e humilhante salário que recebe, se viu obrigada a se escalar no “Bico Oficial” para ganhar um pouco mais, provavelmente para pagar dívidas, algo que é realidade entre policiais militares em São Paulo, do Soldado ao Coronel, da ativa e da reserva.
Estou triste, mas já não tenho mais lágrimas para chorar: elas já se minguaram em função das tantas outras vezes que já chorei pela mesma razão.
Deus te receba, Sargento Taís e dê forças para que suas filhas, sua família e seus amigos suportem a dor da sua ausência.
Em tempo: sei que a situação econômica é muito complicada e que é por necessidade extrema que muitos policiais militares se escalam na DEJEM ou na Operação Delegada, mas se pudesse dar um conselho, diria para que não fizessem isto, pois as suas vidas são preciosas demais para serem ceifadas como foi a da Sargento Taís.
(*) é Coronel da Reserva da Polícia Militar do Estado de São Paulo.